Boletim Eletrónico APECA n.º 35 (Maio/2020)

Artigo técnico preparado por Carlos Lemos para APECA:

“Trabalhadores Não Residentes vs. Regulamento Comunitário s/ Segurança Social”

Inúmeros são os constrangimentos inerentes à problemática em epígrafe. Incompreensivelmente, as informações prestadas pelas entidades competentes, quer nacionais, quer comunitárias, são, por vezes, contraditórias, abstratas e sem fundamento legal, ao contrário do que seria exigível. Como é evidente, toda a informação, sobre este tipo de questões, deveria estar devidamente compilada, sintetizada, clara e acessível. Lamentavelmente, tal não verifica.

Não obstante o substancial abrandamento da mobilidade dos negócios e pessoas, protagonizado, globalmente, pela pandemia covid-19, será espectável a retoma da “nómada” realidade. Ou seja, são cada vez mais os casos práticos de sujeitos passivos titulares de rendimentos obtidos no estrangeiro, assim como auferidos por não residentes.

Com o escopo de clarificar a problemática em questão, cumpre enunciar os respetivos normativos comunitários.

A coordenação dos sistemas de Segurança Social, no concernente à determinação da legislação aplicável, encontra-se prevista nos artigos 11º a 16º no Título II do Regulamento nº 883/2004, e, nos artigos 14º a 21º do Título II do Regulamento nº 987/2009.

De acordo com o art.º 11º do Regulamento de Base (Regulamento nº 883/2004), o princípio orientador das regras gerais, em matéria de determinação da legislação aplicável, é o de que as pessoas, às quais os Regulamentos são aplicáveis, estão sujeitas, apenas, à legislação de um único Estado-Membro (princípio da unicidade da legislação, aplicável), ao contrário do que se verifica fiscalmente, face à vigência de convenções para evitar a dupla tributação, verificando-se, em variadíssimas situações, a competência de tributação, quer pelo Estado de Residência, quer pelo Estado da Fonte.

Tratando-se de pessoas que exerçam atividade por conta de outrem, ou por conta própria, num determinado Estado-Membro, devem ser sujeitas à legislação de Segurança Social desse Estado (princípio da lex loci laboris).  

Um empregador que não tenha a sua sede social, ou centro de atividades, no Estado-Membro cuja legislação é aplicável aos seus trabalhadores, deverá cumprir as obrigações, previstas pela legislação daquele Estado-Membro, designadamente a de realizar o pagamento das contribuições, cfr. demanda o n.º 1 do art.º 21º do Regulamento n.º 987/2009.

Se o empregador não tiver o centro de atividades no Estado-Membro, cuja legislação é aplicável a um seu trabalhador, poderá estabelecer um acordo com o colaborador no sentido de ele concretizar as obrigações do empregador, por conta deste, relativamente ao pagamento das contribuições. Com efeito, o empregador deverá dar conhecimento, do referido acordo, à entidade competente do Estado-Membro onde é trabalho é realizado, cfr. determinado pelo n.º 2 do art.º 21º do Regulamento n.º 987/2009.

Através deste procedimento, fica preenchido um vazio que, de outra forma, obrigaria a soluções muito mais complexas e onerosas que dificultariam a liberdade de circulação de trabalhadores e de prestação de serviços.

Assim, se determinada trabalhadora, residente na Bélgica, vai ser contratada por uma empresa portuguesa para exercer a sua atividade no território onde reside, as regras aplicáveis, para efeitos de Segurança Social, deverão ser as vigentes na Bélgica, independentemente da entidade patronal ter a sua sede em Portugal.

No que se refere aos documentos necessários para inscrição da trabalhadora, uma vez que o Estado-Membro competente para receber as contribuições é a Bélgica, a entidade empregadora e/ou a beneficiária deverão informar-se junto das respetivas autoridades competentes desse mesmo Estado-Membro.

Da discussão nasce a luz. Todo o contributo é bem-vindo. Seguimos juntos!

Carlos Lemos
Fiscalista (AFP/IFA) - 29/05/2020

 
Publicado no Boletim Eletrónico APECA n.º 35 (Maio/2020)


Boletim Eletrónico APECA n.º 35 (Maio/2020)