Boletim Eletrónico APECA n.º 39 (Setembro/2020)

Artigo técnico preparado por Carlos Lemos para APECA:

“A Reconstrução da Rede de Acordos Tributários Internacionais -
Considerações e Conclusões (IFA)”

A reconstrução da rede de tratados fiscais internacionais consubstancia-se num dos dois grandes temas (a segunda temática versa sobre a troca de informação no âmbito das convenções para evitar a dupla tributação), em 2020, objeto de investigação, análise e discussão, protagonizada pela IFA (International Fiscal Association), cuja difusão foi concretizada através da publicação do volume 105 dos Cadernos de Direito Fiscal Internacional da IFA. Com efeito, cumpre partilhar as principais considerações/conclusões do relatório geral sobre a problemática em epígrafe (in Cahiers de Droit Fiscal International - IFA, vol.105, 06/2020, pp.17-19).

Das variadíssimas ações, promovidas pela OCDE/G20, no âmbito do projeto BEPS (Base Erosion and Profit-Shifting), importa destacar uma das mais ambiciosas, responsável pela introdução de diversas alterações aos acordos tributários. Com o escopo de dissuadir a evasão artificial ao estatuto de estabelecimento permanente e a atribuição de benefícios em circunstâncias impróprias, bem como auxiliar a neutralização dos efeitos das assimetrias híbridas (hybrid mismatches) e melhoria no processo de resolução de disputas fiscais internacionais, tais alterações foram, inclusive, propostas nos Planos de Ação BEPS, e, consequentemente, incorporadas no Modelo de Convenção Tributária da OCDE (2017 OECD Model Tax Convention and Commentaries).

Tais modificações, foram, também, introduzidas na Convenção Multilateral para Implementar Medidas do Tratado Tributário para Prevenir a Erosão de Base e Transferência de Lucros (MLI / Multilateral Instrument / Multilateral Convention to Implement Tax Treaty Related Measures to Prevent Base Erosion and Profit Shifting), concebida com o propósito de permitir a eficiente, e rápida, modificação dos inúmeros acordos fiscais bilaterais. O instrumento multilateral (MLI), em questão, é qualificado como marco histórico da fiscalidade internacional, não apenas por introduzir uma terceira camada de normas tributárias incidentes sobre as operações transfronteiriças, alterações à legislação fiscal nacional e aos tratados tributários bilaterais, mas, igualmente, pelo facto de modificar disposições específicas de CTAs (Covered Tax Agreements), determinados pelas jurisdições signatárias da Convenção.

Apesar de o MLI visar a célere reconstrução/reforma da rede das convenções fiscais internacionais, o seu grau de materialização dependerá, necessariamente, do número de Estados contratantes da Convenção e respetivos CTAs, por si designados, assim como das disposições específicas do MLI, determinadas por cada jurisdição. Simultaneamente, deverá ser realizada, também, a avaliação do efeito projeto BEPS, na rede de tratados tributários bilaterais e regionais, com particular atenção para o nível de incorporação das disposições revistas, quer no Tratado MLI, quer no Modelo de Convenção Tributária da OCDE de 2017. Todavia, o grau de sucesso (eficácia), de tais revisões, dependerá, como é evidente, da capacidade de implementação prática das jurisdições contratantes.

Tendo em consideração que, em março do corrente ano, o número de jurisdições contratantes ascendia a 94 e que mais de 1.600 CTAs foram alvo de alterações pelo MLI, parece legítima a reclamação, por parte da OCDE, do sucesso da iniciativa/medida. Não obstante, impera perceber se a vigência do MLI perdurará, a médio/longo prazo, como “terceira camada”, ou se, pelo contrário, assistiremos à diminuição do seu prestígio face à renegociação, por parte dos Estados signatários, dos respetivos acordos fiscais bilaterais.

Da discussão nasce a luz. Todo o contributo é bem-vindo. Seguimos juntos!

Carlos Lemos
Fiscalista (AFP / IFA)
29/09/2020

Artigo técnico preparado por Carlos Lemos para APECA: “A Reconstrução da Rede de Acordos Tributários Internacionais - Considerações e Conclusões (IFA)”

Publicado no Boletim Eletrónico APECA n.º 39 (Setembro/2020)


Boletim Eletrónico APECA n.º 39 (Setembro/2020)